OAB - Santos

OAB - Santos - Principal

O Desafio da Saúde Digital: Startups como ativo para efetividade de políticas públicas de acesso a Saúde.

11/02/2020 Voltar

Articulista: Herculys Silva Barbosa


Crédito: rawpixel.com - www.freepik.es

A elevada demanda somada ao alto custo por um bom atendimento, inclusive, não raras as exceções de escassez de profissionais de algumas especialidades médicas, tem chamado o interesse de empreendedores e investidores para tentar expandir no Brasil o mercado da "Saúde Digital".
A acessibilidade a saúde é uma das maiores dores dos brasileiros. Será que as Startups também conseguem propor soluções para efetivar políticas de acesso à saúde com qualidade e a custo baixo?
Costumamos observar que Startups trabalham com um fluxo simplificado para solução de dores:

    

Legenda: Fluxo: problema, atores envolvidos, ruídos de comunicação e proposta de solução.
(Crédito:Foto de Personas creado por pch.vector https://www.freepik.es)

Peguemos o exemplo da Startup Docway, fundada em 2015, que permite que médicos e usuários utilizem uma plataforma para agendar consultas presenciais, sendo que o diferencial é que o médico cadastrado na plataforma vai direto a casa do paciente. Todo o pagamento deve ser feito por meio da plataforma. Um modelo de sucesso que tem gerado comodidade e acessibilidade a saúde os para seus usuários.

Já a Startup TelaVita fornece serviços de atendimento online de profissionais psicólogos, nos quais os pacientes podem agendar consultas e serem atendidos sem a necessidade de irem aos consultórios destes profissionais. Vale lembrar que, a Resolução CFP nº 11/2012, do Conselho Federal de Psicologia, autoriza a prestação deste tipo de serviço à distância por meio de serviços tecnológicos.
Essas soluções diminuem o custo dos serviços e permitem que mais usuários busquem tratar problemas de saúde, inclusive, os de cunho emocional, que até antes eram associados a alto custo.
Vale dizer que a escalabilidade do serviço permite a diminuição de seu preço sem que isto impacte tanto a remuneração do prestador de serviço.
Até aqui, não vemos nenhuma implicação legal.

Apesar destes dois bons modelos de negócio, será que esse novo mercado da Saúde Digital possui barreiras jurídicas à entrada?
Notem que, quando o assunto é a telemedicina cujos serviços de atendimento médico, incluindo consultas, exames e triagens por meio de plataformas digitais, o empreendedor que quiser desenvolver soluções neste nível de complexidade vai enfrentar barreiras regulatórias.
Para este cenário, a falta de regulamentação de Políticas Públicas para o exercício destas atividades inovadores tem representado uma barreira jurídica para entrada de Startups neste mercado. Aqui temos um dilema: não basta empreender é preciso ter segurança jurídica para desenvolver qualquer atividade!
Destacamos que os empreendedores redobrem a sua atenção e sejam acompanhados por advogados com conhecimento jurídico regulatório, justamente, a fim de permitir uma boa análise do modelo de negócio e minorar riscos à possíveis sanções legais.
Trazemos aqui outro cenário da Startup TelaVita, que citamos anteriormente, esta já possui infraestrutura para prestação de serviços por meio de consultas médicas online, mas decidiu suspender este tipo de prestação, em face da ausência de uma regulação clara e segura neste setor.

O case - Ausência de segurança jurídica
Atualmente, há em vigor um debate no Senado, sobre a necessidade do Brasil desenvolver uma Política de Saúde Digital, assim, traduzindo-se na regulamentação da Telemedicina.

Esse assunto no Brasil está sem pai e sem mãe, sem avô e sem avó. Nós não temos um projeto de saúde digital para o país. E isso precisa se tornar oficial na saúde desse país em todas as instâncias. E precisa, realmente, de apoio político. Destaca Luiz Oliveira, representante da Associação Médica Brasileira.

Em 2018, o Conselho Federal de Medicina, chegou a publicar a Resolução CFN 2.227/18, que regulamentava os serviços de telemedicina e, inclusive, a sua prática estava condicionada apenas ao aceite livre pelo paciente. Todavia, após pressões da classe médica, a referida Resolução foi revogada e passou a viger novamente a Resolução Resolução CFM nº 1.643/2002.

Qual a implicação deste recuo?
A Resolução restabelecida pressupõe que o paciente seja acompanhado por um médico responsável por lhe prestar assistência, sendo que o serviços de telemedicina deverão ser ofertados apenas para os serviços de laudeamento de exames de forma não presencial, tendo como única hipótese de atendimento à distância os casos de emergência. Nesta situação o médico laudeante, deverá ter a permissão do médico responsável por assistir o paciente para prestar o suporte diagnóstico e terapêutico (art. 3º, Resolução CFM nº 1.643/2002) .
 
Vale lembrar que, todos os profissionais responsáveis pelo atendimento possuem responsabilidade solidária por erros decorrentes da prestação de serviço. Mas, o médico que presta assistência ao paciente responde profissionalmente e diretamente (art. 4º Resolução CFM nº 1.643/2002).
 
 
Considerações Finais e o Cenário para 2020
 A discussão e os dados apresentados evidenciam que as Startups lastreadas em modelos de negócios a base de Tecnologias da Informação e Comunicação - TICs representam soluções que podem dar efetividade a políticas públicas. Entretanto, a velocidade das ideias e as soluções trazidas enfrentam a barreira do descompasso entre a adequada discussão e instituição de regulamentações, por meio do Poder Legislativo, de Políticas Públicas que permitam aos empreendedores exercer suas atividades com os imperativos de segurança jurídica necessária.
Segundo Guilherme Henrique de La Rocque Almeida:

O tempo político-legislativo é diferente do tempo real das demandas sociais, o que imputa ao gestor das decisões políticas um comportamento de análise de custos e benefícios da elaboração e aplicação de políticas públicas.

Por hora, verificamos que empreendedores e suas Startups que têm buscado desenvolver modelos de negócios que resolvem problemas, que embora relacionados a serviços básicos como: o acesso a saúde, têm conseguido remodelar mercados e, podem gerar um impacto social e econômico que mudará o ambiente onde atuam, podendo tornar Políticas Públicas efetivas.

Políticas Públicas, segundo distingue Fábio Konder Comparato, 2013[1], não correspondem a uma norma legal ou ato em si, mas a um conjunto de normas e atos que permitem que a finalidade de determinada Política Pública seja atingida.

Essa nova realidade dará ao Estado a possibilidade de sanar carências e aos empreendedores voz e participação na gestão destas dores.

Por derradeiro, e o que temos para o ano de 2020?
O ano de 2020, já está com o seu segundo mês iniciando e o mercado já especula que novas Startups brasileiras como a CargoX, plataforma de gestão de transporte de carga rodoviária, o grupo de ecommerce Vtex, o aplicativo de viagens de ônibus Buser e a plataforma de compra e venda de veículos usados Volanty estão cotadas para alcançar a categoria de unicórnios, que são as empresas que alcançam o valor de mercado equivalente a 1 bilhão de dólares, segundo matéria veiculada pela epocanegocios.
É inspirador e motivador!
Autor:Herculys Silva Barbosa
Advogado Especialista em Direito Empresarial.


[1] Comparato, Fábio Konder Rumo à justiça / Fábio Konder Comparato. - 2. ed. - São Paulo : Saraiva, 2013. (p.303)